O Tribunal de Contas do Estado firmou parceria com o TCU para fornecer as informações necessárias
A forma como recursos foram desviados da Secretaria de Estado da Saúde, de 2009 até 2013, que podem chegar a mais de R$ 100 milhões, será minuciosamente investigada pelo Ministério Público Federal e Tribunal de Contas da União e Controladoria Geral da União. Ontem, o Tribunal de Contas do Estado do Maranhão firmou parceria com o TCU para fornecer as informações necessárias.
O Ministério Público Federal e a Polícia Federal iniciaram investigações preliminares sobre as ações da pasta da Saúde, notadamente sobre a aplicação do dinheiro na construção de hospitais de 20 e 50 leitos pelo programa Saúde É Vida. Estima-se que já foram gastos perto de R$ 3 bilhões durante todo esse período e dos 72 hospitais prometidos apenas 34 foram entregues.
Na sede da Fiema, o presidente do TCU, ministro Augusto Nardes solicitou ao TCE a parceria e que os documentos estejam à disposição dos técnicos da do seu órgão e da CGU. As primeiras investigações irão começar pelos contratos de obras e convênios feitos pela Secretaria de Saúde, dirigida pelo cunhado da governadora, o deputado licenciado Ricardo Murad.
O papel do TCE é de fundamental importância para desmontar toda a rede de corrupção que sangrou o dinheiro público através de contratos fraudulentos e licitações viciadas e dirigidas.
O blog do Luis Cardoso tomou conhecimento de quem existem até gravações de conversas entre gente graúda da Saúde estadual e empresários do Rio de Janeiro e São Paulo sobre o valor da propina a ser recebida de empresas que prestam serviços ou que vendem equipamento para a pasta comandada por Ricardo Murad. A coisa é feia e exala podridão.
Em 2011, a jornalista Cláudia Dantas Siqueira, da revista IstoÉ esteve no Maranhão para elaborar uma reportagem bomba que mostrou como funcionou a corrupção com o dinheiro público.
Veja abaixo a matéria da IstoÉ:
Quem percorre o interior do Maranhão se surpreende com a quantidade de esqueletos de grandes obras abandonadas e expostas ao tempo. Várias delas estão em municípios humildes como Marajá do Sena, Matinha e São João do Paraíso. São hospitais públicos inacabados do programa Saúde é Vida, principal bandeira da campanha de reeleição de Roseana Sarney (PMDB). Com apenas 12% do cronograma cumprido desde que foi lançado há dois anos, o projeto já tem um custo superior a R$ 418 milhões e corre o risco de virar mais um imenso monumento à corrupção. Relatório da Procuradoria de Contas maranhense, obtido com exclusividade por ISTOÉ, acusa o governo de fraudar o processo licitatório, pede a devolução de parte dos repasses e a aplicação de multa ao secretário de Saúde, Ricardo Murad, cunhado da governadora. A investigação dos procuradores Jairo Cavalcanti Vieira e Paulo Henrique Araújo, a partir de representação do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Maranhão, revela um cipoal de irregularidades e mostra como o governo beneficiou empreiteiras que depois abasteceram o caixa de campanha do PMDB com mais de R$ 2 milhões.
Os problemas começaram no segundo semestre de 2009, quando o governo de Roseana resolveu lançar o Saúde é Vida. Mesmo sem previsão orçamentária, a governadora conseguiu incluir o programa no Plano Plurianual e entregou sua execução ao cunhado. Murad, alegando urgência, contratou sem licitação a empresa Proenge Engenharia Ltda. para a elaboração dos projetos básico e executivo. Os procuradores descobriram que, na verdade, o projeto básico já tinha sido elaborado por técnicos da própria Secretaria de Saúde. A mesma Proenge venceu, logo depois, um dos lotes da concorrência 301/2009 para a construção de 64 hospitais de 20 leitos. O edital da obra indicava que as empreiteiras vencedoras deveriam elaborar o projeto executivo dos hospitais. Ou seja, a empreiteira acabou recebendo duas vezes para prestar o mesmo serviço. No total, a Proenge recebeu R$ 14,5 milhões. Para os procuradores do TCE maranhense, que questionam o caráter emergencial da contratação, “os valores pagos à empresa Proenge constituem lesão ao erário e devem ser objeto de ressarcimento”. Eles calcularam em R$ 3,6 milhões o total que deve ser devolvido.
As ilegalidades não param aí. A construção dos hospitais de 20 leitos foi dividida em seis lotes, mas três deles simplesmente não entraram na licitação. Foram entregues a três empreiteiras diferentes: Lastro Engenharia, Dimensão Engenharia e JNS Canaã, que receberam quase R$ 64 milhões em repasses e nem sequer construíram um hospital. A JNS Canaã é um caso ainda mais nebuloso. Os procuradores afirmam que a empreiteira, filial do grupo JNS, teve seu ato constitutivo arquivado na Junta Comercial do Maranhão em 24 de novembro de 2009, dias antes de fechar contrato com o governo. A primeira ordem bancária em nome da JNS saiu apenas quatro meses depois, em 16 de abril de 2010. Sozinha, a empresa recebeu R$ 9 milhões, não concluiu nenhum dos 11 hospitais e teve seu contrato rescindido por Murad. Antes, porém, a mesma JNS doou R$ 700 mil para a campanha de Roseana, por meio de duas transferências bancárias, uma de R$ 450 mil para a direção estadual do PMDB e outra de R$ 300 mil para o Comitê Financeiro, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral.
A Dimensão Engenharia e Construção Ltda., outra das contratadas sem licitação, foi ainda mais generosa ao injetar R$ 900 mil no caixa do partido durante a eleição. A Lastro Engenharia, por sua vez, repassou aos cofres peemedebistas mais R$ 300 mil. A empresa conseguiu dois contratos com dispensa de licitação: a reforma do Hospital Pam-Diamante, em São Luís, e a construção de hospitais de 20 leitos. Além disso, foi uma das vencedoras da disputa (licitação número 302/2009) para erguer unidades de saúde com 50 leitos. Esses contratos foram aditivados em 25% (o limite legal previsto pela legislação). Ao todo, a empreiteira faturou R$ 58 milhões. O uso do limite para elevar o valor dos contratos foi utilizado também por outra construtora, a Ires Engenharia, o que alertou os procuradores do TCE. “Chama a atenção o fato de o valor acrescido aos contratos coincidir até nos centavos com o valor limítrofe previsto em lei. A impressão que se tem é que ou o valor originariamente contratado foi equivocado ou os aditivos foram firmados sem critério estritamente técnico”, escreveram no relatório.
Para o deputado Domingos Dutra (PT), os problemas no programa Saúde é Vida vão além do anotado pelos procuradores. Um levantamento das ordens bancárias de 2010 mostra uma série de repasses redondos que, segundo Dutra, “indicariam a prática de caixa 2 para abastecer a campanha de Roseana.” A Dimensão Engenharia, por exemplo, recebeu R$ 1 milhão em 19 de julho. Três dias antes, a empreiteira Console apresentou fatura de R$ 2 milhões. No mesmo dia, o governo pagou mais R$ 1 milhão à Geotec e R$ 1,5 milhão à Guterres, que no dia 22 recebeu mais R$ 500 mil. A JNS teve três repasses redondos: R$ 300 mil e R$ 50 mil em 16 de abril e R$ 1,5 milhão em 16 de julho. A Lastro teve um repasse de R$ 1,5 milhão; a Proenge, dois repasses de R$ 600 mil e R$ 300 mil; e a Ires Engenharia, um pagamento de R$ 1 milhão. “Nenhuma empresa emite nota fiscal pela prestação de serviços com números redondos”, afirma Dutra. “Geralmente são valores fracionados, até em centavos, como vemos nas dezenas de outras ordens de pagamento.” O parlamentar encaminhou petição ao Ministério Público Federal e à Controladoria-Geral da União.
Além dos indícios de corrupção e do uso das obras para angariar dividendos políticos, o deputado federal Ribamar Alves (PSB) ataca a concepção do Saúde é Vida, que, segundo ele, contraria determinações do próprio Ministério da Saúde sobre a construção de hospitais em cidades com menos de 30 mil habitantes. “Essas prefeituras não têm dinheiro para a manutenção desses hospitais nem médicos suficientes ou demanda”, afirma. Ele estima em R$ 500 mil o custo mensal para a manutenção dessas unidades, valor acima da soma dos repasses do Fundeb, do SUS e do Fundo de Participação dos Municípios. “Sem gente nem dinheiro, esses hospitais vão se transformar em imensos elefantes brancos”, diz Alves. O parlamentar lembra que a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara aprovou requerimento do deputado Osmar Terra (PMDB/RS) para convidar Murad a prestar esclarecimentos sobre o programa e outros problemas na área da saúde. “Ele tem muito o que explicar”, afirma. Procurado por ISTOÉ, o secretário de Saúde do Maranhão não se manifestou até o fechamento da edição.
Reportagem reproduzida da Revista ISTOÉ.
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